Caminho II
Encontraste-me um dia no caminho
Em procura de quê, nem eu o sei.
- Bom dia, companheiro - te saudei,
Que a jornada é maior indo sozinho.
É longe, é muito longe, há muito espinho!
Paraste a repousar, eu descansei...
Na venda em que poisaste, onde poisei,
Bebemos cada um do mesmo vinho.
É no monte escabroso, solitário.
Corta os pés como a rocha dum calvário,
E queima como a areia!... Foi no entanto
Que chorámos a dor de cada um...
E o vinho em que choraste era comum:
Tivemos que beber do mesmo pranto.
Caminho III
Fez-nos bem, muito bem, esta demora:
Enrijou a coragem fatigada...
Eis os nossos bordões da caminhada,
Vai já rompendo o sol: vamos embora.
Este vinho, mais virgem do que a aurora,
Tão virgem não o temos na jornada...
Enchamos as cabaças: pela estrada,
Daqui inda este néctar avigora!...
Cada um por seu lado!... Eu vou sozinho,
Eu quero arrostar só todo o caminho,
Eu posso resistir à grande calma!...
Deixai-me chorar mais e beber mais,
Perseguir doidamente os meus ideais,
E ter fé e sonhar - encher a alma.
Camilo Pessanha [nasceu faz hoje 141 anos]
Fotografia, TINTA AZUL, 05.08.08
4 comentários:
No Parque dos Poetas, de Paço de Arcos, também o podemos ver. É o meu último post.
Poema denso, mas autentico.
Reconhecido
Beijos
bebo da mesma taça. gosto desse vinho...
..."E ter fé e sonhar - encher a alma". belo
Ter fé ,para encher a alma é o que preciso neste momento,porque sonhar não me apetece.Apesar de tudo voltei a estes lugares que trago no coração.
vadia
Só tive tempo de ler os poemas na diagonal. Prometo vir com calma.
Bj
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