13/09/08

LEMBRAR NATÁLIA

.
















ANTILÓGICA

I

O esquivo rosto contrito
do pensador consequente
revela visualmente
a ontologia do grito

depois recluso e contracto
no contrato contratempo
que se faz com o abstracto
projecto de sermos gente.

Nascer é ficar aflito
depois estender a mão
pedir pão ao infinito
que é também abstracção.

O coraçao é o grito
que o pensamento repete
vem daí que a reflexão
é a aflição de quem reflecte.

Consequência não reflito.

II

Não ter a mínima ideia
por contíguos sons achar
sobre o papel o território
e ternamente o habitar.

Alterado amor
das coisas que se buscam
os ares soltando
da pátria brusca

mente a nossa
que nos é dada
pela língua cósmica
falante não falada.

III

Não mais os sons
do discursivo engasgo.
Resposta em seus dons
seja a palavra o rasgo

que à superfície traz
a luz do fundo
e o nosso modo mudo
de estar no mundo.

Das flores o canto
aves vogais
e o Amor címbalo de
sons naturais.

Natália Correia [1923 - 1993]. No dia em que fazia 85 anos.

in Poesia Completa, Lisboa, Dom Quixote, 1999.


Imagem - Fotografia. TINTA AZUL. Agosto 2008.

6 comentários:

Duarte disse...

Que grande dona Natália!!!

:)))

cristal disse...

Faz cá falta a Natália. Como poeta e como PESSOA / GENTE que também partiu muito cedo de entre nós.

mariam [Maria Martins] disse...

Olá!
bela homenagem...
obrigada!
(não me havia dado conta...)

cheguei das abençoadas férias, voltarei aqui de novo para ler os outros posts...

bom fim-de-semana
um sorriso :)

mariam

Juani disse...

me gusta mucho, sobre todo
OSCURA CASTIDAD
Una oscura e inquieta castidad puso una flor para mí en el jardín más secreto
en un horizonte de gracia y claridad
intangible y próximo.
Promesa estática en la luz de la luna
de la densidad en mí corpórea
no es la culpa, es la memoria
de la primera mañana del pecado sin Eva y sin Adán.
Sólo el fruto probado
y la serpiente enroscada
en mi soledad.
saluditos

Justine disse...

A pureza e depuração da foto a contrastar com um certo "gongorismo" do poema. Mistura fina:))

Manuel Veiga disse...

gosto da Natália - excessiva. carnal... e misteriosa.

como a vida. e a poesia...

bela ilustração.

beijo